20 junho 2011

A Justiça além de cega é Meretriz

escrito por Carla Kruspe,

Quando eu era criança, eu e meus amiguinhos brincávamos de amarelinha, queimadinha, pique bandeira, ciranda e outras tantas brincadeiras na rua onde morávamos. Quando nossos pais e irmãos mais velhos tinham tempo, entravam na brincadeira também. Em junho realizávamos 3 Festas Juninas: Santo Antonio, São João e São Pedro (acho que São Pedro não sou boa em referências católicas). Em janeiro andávamos curiosos atrás da Folia de Reis. Quando chegava Sábado de Aleluia, que engraçado acordarmos cedo para vermos os "Judas" que as pessoas haviam feito de vizinhos malvados. Éramos verdadeiramente felizes e amigos. Brincávamos livres e saltitantes pelas ruas, mas nenhum de nós virou ladrão, usuário de drogas ou qualquer outra coisa parecida por vivermos soltos no nosso bairro.

Hoje, quem é pobre tem que ficar confinado ao seu barraquinho humilde. Quem é rico, desfruta a vida olhando a tela de suas janelas, as grades de seus condominios. As crianças são condenadas a brincar de casinha em míseros 54 metros quadrados de apartamentos na maioria das vezes mofados por falta de sol.

Não vemos mais crianças cantando "ciranda cirandinha vamos todos cirandar". Não vemos mais crianças com casinhas na árvore, cavalinhos de cabo de vassoura, caminhãozinho carregando barro, cobra de espada de São Jorge pra assustar vizinhos (que fingiam se assustar).

Cada rua não tem mais sua Festa Junina, vizinhos não mais dividem a canjica, não existe mais a confraternização que tinhamos nas nossas ruas, para nós sobraram somente os assaltos.

A União da Ilha do Governador fazia eventos grandes, com som muito alto, entrava pelas madrugadas como se o carnaval fosse o ano inteiro. Os moradores entraram na justiça contra a União. Em que resultou? A justiça pediu que a União fizesse seus eventos em horários diúrnos, o que foi prontamente acatado, mesmo na dúvida se "tal horário" daria certo, porque até então, eventos como os que eram realizados eram realmente para a noite. Mas ao contrário do que se esperava, os eventos foram um sucesso ainda maior nos horários diúrnos e muitos dos moradores que entraram na justiça, passaram também a ir aos eventos felizes da vida.

Com relação a extinção dos eventos de rua, o que se tem é o seguinte: O Governo do Estado, a Prefeitura e o Ministério da Cultura não têm o menor interesse em levar cultura à população pobre. A intenção deles é que o pobre se mantenha analfabeto, ignorante, sem formar opinião, sem tomar atitudes, sem saber se defender.

Senhores, se eu montar uma cia teatral e decidir fazer apresentações para crianças carentes na rua, sabiam que é proibido como se fosse crime? Sabia que se eu quiser ensinar pessoas a ler e escrever é crime? Sabiam que se eu montar uma biblioteca em uma comunidade e fazer radas de leitura e poesia é crime? Sabiam que se eu levar filmes para exibir para moradores de localidades carentes é crime?

O que foi feito das Lonas Culturais do Rio de Janeiro destinadas a levar cultura aos mais pobres, os senhores sabem dizer? A Prefeitura tem verba pra apoiar Rock in Rio e mais trocentos outros eventos envolvendo grandes gravadoras mas não pode ajudar as Lonas Culturais? O objetivo é valorizar as "Majors" porque essas empresas imprestáveis e decadentes sobrevivem agora da venda de shows de seus artistas grandes. Artista pobre ou classe média que não tem pistolão, pra ser valorizado e reconhecido, só por meio de milagre, porque é podado de todos os lados para não roubar a cena. Não roubar o lugar dos queridinhos das "Majors". Por isso senhores, perdoem a expressão, que todo artista grande quando peida, sai em todos os sites, mas pessoas e instituições que lutam pela vida, nunca recebem um espacinho de 5 cm por 1 coluna para falar sobre o que realmente é relevante. Artista pobre aparecer em site grande? Só se tiver ido pra cama com algum Global ou queridinho de "Majors". Aliás, não são todos, óbvio, mas os queridinhos das "Majors" são um verdadeiro lixo musical empanados por agências de publicidade. Haja photoshop pra tanta baranga bêbada meu Deus!

O Santa Música foi cancelado. Segundo todos os jornais que eu li, nada desabona a reputação dos organizadores do evento. O que se deu é que o Ministério Público acatou o pedido de uma minoria ao invés de acatar o pedido da maioria.

Não conheço ninguém da organização do Santa Música, não tenho motivos para defendê-los ou atacá-los. O fato é que uma pessoa fez um evento de Facebook para protestar contra o cancelamento do Santa Música. Não a favor dos organizadores do evento, mas defendendo o direito que cada um de nós brasileiros temos de TER CULTURA, FESTAS DE RUA, FESTAS POPULARES, FESTA ONDE NOSSOS IRMÃOS POBRES POSSAM DESFRUTAR DO NOSSO CARINHO E COMPANHIA. Mas essa pessoa foi covardemente atacada por defender nosso direito de nos reunirmos e sermos pessoas felizes.

Outros aproveitam o evento do Facebook para atacar os organizadores do Santa Música. O que os organizadores do Santa Música têm a ver com nosso direito de celebrarmos nas ruas o fato de estarmos vivos, de sermos humanos e que queremos crescer culturalmente e socialmente junto com nossos irmãos mais pobres?

Ninguém está lutando pelos organizadores do Santa Música ou para que o Ministério Público faça a festa acontecer. Estamos lutando pelo nosso direito de ter cultura acessível a todas as classes sociais brasileira. Podemos lotar shows internacionais e encher o rabo de estrangeiros de dinheiro enquanto muitos não têm uma TV, nunca tocaram em um PC e quando vestem sua roupinha mais bonitinha pra estar conosco, a justiça fala: "Sai fora pobre, volta pro seu lugar!"

Não é isso que o que eu quero para mim. Não é esse o mundo que eu quero para os meus semelhantes. Não estou defendendo o Santa Música. Estou defendendo o humano faminto, de olhar triste, que alguns observam por alguns segundos enquanto o sinal não abre. Como se os vidros de seus carros importantos fosse uma TV e depois de engatar a primeira do carro, aquele ser faminto é "mudado de canal" como um comercial da vida que ninguém quer ver.

Carla Kruspe: Deve estar cheio de erros de português, mas o MEC disse: "Foda-se o português!"..
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